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domingo, 19 de fevereiro de 2012

Vida, Avenida: Reflexões Sobre o Carnaval


Não há nada que defina tanto o brasileiro em sua cultura e mentalidade quanto o carnaval. Aqui me cabe chamar a atenção dos filósofos, pois caso se interessem em identificar uma “filosofia brasileira” esta teria em tal festa popular uma temática bem extensa. O culto ao corpo, a valorização dos sentidos e o prazer imediato como valor fundamental. 

Há uma vida de verdade e outra de mentira; de fantasias, plumas, brilho, máscaras e prazer. Há uma vida de festa e outra de trabalho, de rostos sofridos e consumidos pela velhice antes do tempo, de cansaço e estresse. Há uma vida onde se predomina o desejo e a liberdade e outra onde prevalece a opressão e a obediência como forma de sobrevivência. Não gostamos dessa vida, e por isso, inventamos outra mais doce, e fugimos para ela, pelo menos, provisoriamente. 

Não há liberdade. Há entorpecimento. Não podemos privar o brasileiro de alegria, não tenho a intenção de evocar moralismos, contudo, é preciso evocar a alegria em sua autenticidade e não comprada a preço de sangue. No passado, essa festa, era feita pelos negros das senzalas por concessão dos senhores de engenho, hoje, os senhores são outros, mas os escravos continuam os mesmos. Nossa realidade se resume a corpo, fazendo dos nossos valores norteados apenas pela busca ao prazer. Alguns fazem da vida uma grande avenida, outros, um extenso corredor da morte. Não há esperança para nenhum dos dois, que em resumo, fazem da vida apenas uma agradável (ou não) espera para a morte.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Pré – Venda de “O Eterno e o Transitório”


Caríssimos,
Meu livro “O Eterno e o Transitório” está em pré-venda.  O lançamento está previsto para abril/maio deste ano. Entretanto, é possível encomendar o livro antecipadamente, contribuindo para a sua publicação pela editora “Livros Ilimitados”. Deixando claro que os exemplares encomendados antecipadamente serão entregues via correio (com as despesas por minha conta) a partir do lançamento oficial do livro. O número de exemplares vendidos em pré-venda é restrito a 30 exemplares. O valor do exemplar será de R$: 39,90. Aos interessados deixo a conta bancária em nome de Ana Maria da Conceição Santana (minha mãe) onde é possível realizar o depósito. Em seguida, peço que entrem em contato comigo pelo email: diogosantana45@yahoo.com.br, informando nome completo e endereço para a entrega do livro, em ocasião de seu lançamento: 

Caixa Econômica Federal
Ana Maria A. da C. Santana
Conta: 0190.013.00800301-3

Um abraço,
Diogo Santana.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Epifania


Estou morrendo. 

Epifanias como essa não acontecem todos os dias. A minha, vergonhosamente aconteceu enquanto completamente bêbado, junto a palavras desconexas e choro compulsivo, berrava à todos os pedestres na rua:

“Eu vou morrer!”, “Eu vou morrer!”

Ninguém se atrevia a chegar perto. Temiam que eu fosse violento e perigoso. Alguns riam sem parar e debochavam entre si da cena ridícula que eu fazia. 

Estou morrendo, e isto significa que até aqui, no auge dos meus vinte anos, tenho passado a juventude distraído à jogar meu tempo fora. Isso é assustador, pois afinal, talvez, não haverá mais volta. Não há como recuperar esse tempo, e isso é fato. 

Morrer é inevitável, e toda vez que me imagino num caixão, apodrecendo e sendo devorado por milhões de vermes, me estremece até a alma. Se de fato há alguma. Estou morrendo. Estou gastando tempo. É impossível não deixar de gastar esse tempo. Como saber gastá-lo? É preciso portanto, saber controlar o tempo que se gasta. Não se trata, porém, de um simulado desejo religioso pela eternidade. Não desejo o céu ou o inferno, mas apenas este velho, feio e decadente mundo que vivo. 

Tenho uma estúpida, ou brilhante (dependendo do ponto de vista) idéia de montar uma rotina. Até o final da vida. Não adianta. Não tenho disciplina pra isso. Não me dou bem com relógios e calendários. 

Cheguei aos noventa anos!

Abro os olhos. Dois anjos me encaram. Não sei dizer para onde me levam. No caminho, discutem entre si o que farão da minha alma. Um deles, ironicamente e com um sorriso no rosto perguntou:

- Como é a sensação de morrer?

- Sinceramente não sei. Não estava mais lá quando aconteceu.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Resenha do Livro "Os Últimos Dias" de Liev Tolstói




Ler Tolstói sempre é um grande prazer. Por ser racionalista, o grande escritor russo acredita em demasia no poder da compreensão, no esclarecimento por meio de idéias elevadas. Acredita que o ser humano pode se deixar convencer por um bom argumento, muito embora, às vezes se convença também que isso nem sempre seja o suficiente. De que seja preciso também coração. Os Últimos Dias (Penguin Companhia, 2009), volume contendo uma coletânea de alguns dos últimos textos do escritor, expressa bem essa esperança de Tolstói, resumidas em textos breves sobre a essência de todo o seu pensamento: sua versão moral do cristianismo (trecho de “O Reino de Deus Está Dentro de Vós” e “O que é religião e em que consiste sua essência?”) sua defesa do vegetarianismo (trecho de “O Primeiro Degrau”), seu anti-cientificismo (“Ciência Moderna”), sua aversão ao militarismo e aos governos (“Patriotismo e Governo” e “Carta a um Oficial de Baixa Patente”), seus debates com o clero ortodoxo vigente (“Apelo ao Clero” e “Resposta à Determinação do Sínodo de Excomunhão, de 20-22 de fevereiro, e às Cartas Recebidas Por Mim a esse Respeito”) e sua crítica a adoração cultural a Shakespeare). Há também dois contos que merecem especial atenção: “Onde Está o Amor Deus Também Está” e “Três Perguntas”. Ambos emocionantes. 

Todavia, acredito ser o ponto alto do livro a apresentação, no conjunto da obra, de sua visão particular do cristianismo: a incompatibilidade entre o primeiro e o novo testamento, a descrição metafórica dos milagres, sua recusa em aceitar a divindade de Cristo e a trindade, a inutilidade dos ícones e etc; o que o aproxima do deísmo racionalista e do liberalismo teológico do séc.XIX. O cristianismo, segundo Tolstói é um conjunto de princípios morais estabelecidos por Cristo no sermão da montanha, fundamentado na não resistência ao mal. Princípio esse que o escritor explorou e definiu como a descoberta do sentido de sua vida. A herança deixada por essa compreensão é impressionante: talvez você não seja vegetariano ou liberal (teologicamente), talvez você não seja anarquista e ainda acredite no governo, todavia, é impossível não concordar com Tolstói de que a única maneira possível a fim de aprendermos o amarmos uns aos outros é considerarmos que não podemos fazer aos outros o que não queremos que os outros façam a nós. De que a única forma de acabarmos com a violência é nós mesmos sermos pacíficos, mesmo quando injustiçados, não resistimos ao mal.  

Citação - "Do Primeiro Degrau" - Liev Tolstói


“... o principal interesse das pessoas de nossa época é a satisfação do paladar, o prazer da comida, da gula. Das classes sociais mais pobres às mais ricas, a gula, penso eu, é o objetivo principal, é o principal prazer da nossa vida. O povo pobre trabalhador constitui uma exceção, mas apenas no sentido de que a miséria o impede de se entregar a essa paixão. Quando ele tem tempo e meios para isso, à maneira das classes altas, compra o mais gostoso e o mais doce, come e bebe o quanto pode. Quanto mais come, mais ele se sente não só feliz, mas também forte e saudável. E as pessoas instruídas, que vêem o alimento precisamente dessa forma, apóiam-no em tal convicção. A classe instruída imagina (embora se esforce para ocultá-lo) que a felicidade e a saúde (e disso a convencem os médicos, afirmando que o alimento mais caro, a carne, é o mais saudável) estão no alimento saboroso, nutritivo e facilmente digerível. 

Observem a vida dessas pessoas e escutem suas conversas. Parecem que só se ocupam de temas elevados: filosofia e ciência, arte e poesia, a distribuição da riqueza, o bem-estar do povo e a educação da juventude; mas tudo isso, para a imensa maioria, é uma mentira – eles se ocupam de tudo isso nas horas vagas, entre as verdadeiras ocupações, entre o café da manhã e o almoço, enquanto o estômago está cheio e não é possível comer mais. O interesse vivo e verdadeiro da maioria dos homens e das mulheres é a comida, sobretudo depois da primeira juventude. Como comer, o que comer,quando e onde?

Nenhuma solenidade, nenhuma alegria, nenhuma consagração ou abertura do que quer que seja acontece sem comida. 

Observem as pessoas que viajam. Nelas isso é especialmente evidente. “Museus, bibliotecas, parlamento... que interessante! Mas onde vamos almoçar? Quem oferece a melhor comida?” Mas vejam só as pessoas,como elas se reúnem para o almoço, arrumadas, perfumadas, a uma mesa enfeitada com flores, com que alegria esfregam as mãos e sorriem”

 (Liev Tolstói, Os Últimos Dias, pp.38-39).

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Raízes do Literalismo Hermenêutico Bíblico




“A opção de Javé por locais elevados não é infundada, porque, na condição de guerreiro, ele desce dos montes para combater os inimigos. Seu templo, conforme demonstra Levenson (seguindo Ezequiel, de modo particular), é espiritualmente idêntico ao luxuoso Jardim do Éden, onde ele se aprazia em  caminhar na tarde fresca.  Quando Adão e Eva são expulsos do paraíso (para que não se tornem deuses), o jardim continua a existir, guardado por um querubim. Por conseqüência, a destruição do templo de Javé foi também a obliteração do paraíso, que jamais voltaria a existir, a não ser que o templo fosse reconstruído. Mas se a própria Bíblia substitui o templo, então, o livro também substitui o paraíso, noção que talvez explique por que Ekiba insistia, com tamanha paixão, que o Cântico dos Cânticos, que é de Salomão, deveria ser canônico.  Incapacitado de caminhar no Éden ou de se regalar no Templo, Javé reside na Bíblia hebraica. Ali se sente tão confortável que pode prescindir o terceiro templo, a menos que atualmente (conforme a mim parece, embora não aos que ainda crêem na Aliança) que ele tenha se exilado até mesmo no deleite daquelas páginas”.

Harold Bloom em Jesus e Javé: os nomes divinos. Editora Objetiva. pp. 148.