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terça-feira, 12 de outubro de 2010

Vigília da Noite (Primeiro Texto)

“Para todo aquele que dorme, imerso em toda a profundidade de seus sonhos, e até mesmo de seus pesadelos, nós não existimos, e quando muito, somos para eles como um sonho também. Eles dormem e nós, mesmo com toda a nossa luta contra o sono, estamos ainda muito longe de dormir, tudo o que somos para eles, nada mais é o que não somos e tudo o que eles são, nós estamos acordados e eles não, diferença que permanece e que nos distancia de um conceito, de uma idéia, de um “achar”, e que por isso nos aproxima da certeza. Nós temos uma certeza, eles não possuem certeza alguma, nem mesmo sobre quem eles são. O sono não dá identidade, mas uma fantasia com um nome, gostos e humor, o sono não dá personalidade, apenas um rótulo que é constantemente substituído. Libertemos os homens dos rótulos pela fé que há em nós! Despertemos os homens de seus sonhos fazendo-nos existir para eles, e existir não como sonho, mas como realidade, e isso requer acorda-los de todo o estado vegetativo que se encontram.”
“E, indo, pregai, dizendo: É chegado o reino dos céus” (Cf. Mt. 10.7)

Consciente de sua individualidade diante dos apelos da multidão pedinte e anônima, o homem, cujo relacionamento com Deus se fundamenta na própria individualidade, adquire uma identidade que lhe requer total responsabilidade diante da multidão. O apóstolo é aquele cujo relacionamento estritamente pessoal e intransferível com Deus, lhe destaca dos interesses da multidão, concedendo-lhe identidade que o personifica e o destaca, não como algo elevado, mas profundamente baixo. O apóstolo se identifica pela fé com a exclusão e nela ele socialmente se personifica, isso porque não é qualquer tipo de exclusão que fundamenta a intensidade de seus atos e esforços, tal como a pobreza é o fundamento da exclusão do homem na sociedade, a fé é o nosso fundamento, motivo capital de nossa ação e exclusão.

A fé enquanto fundamento da exclusão de todo aquele que crê, em sociedade, é o motivo de uma pobreza social, não uma pobreza caracterizada pela impossibilidade de aquisição de bens, fruto permanente da desigualdade social, mas sim, pela possibilidade de doação que supera as classes. A “pobreza evangélica” é produto da intensa luta do cristão na extinção das desigualdades sociais em direção à afirmação da individualidade humana, através da doação de si mesmo pela totalidade de suas possibilidades físicas, econômicas, emocionais e intelectuais. A fé doa o homem à massa, todavia, sempre se distingue dela, isso porque a fé jamais se alia à massa, à generalidade, mas apenas ao indivíduo, pois é somente na individualidade que o homem escapa a toda coisificação promovida pela imersão da identidade humana nas sociedades que divinizam o capital, reduzindo o homem à pura funcionalidade maquinal, o que o destitui dessa identidade, conduzindo-o ao anonimato social e espiritual. A fé promove uma identidade para o homem que enquanto possibilidade de doação é ruptura com toda massificação do indivíduo reduzido a funcionalidade de suas ações e a afirmação do indivíduo em sua sociedade, porém,  tal afirmação não deve ser concebida como a alienação do indivíduo em sua liberdade, como impulso aleatório para se determinar uma conduta, a fé é sempre é uma fé para com Deus: a responsabilidade entra como condutor da liberdade social do indivíduo através da consciência que o mesmo tem de sua fé, da intensidade de sua relação com Deus.

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