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domingo, 31 de março de 2013

Considerações Sobre o Amor Cristão


O amor é uma exigência divina, contudo, o tratam como exigência humana.

É preciso partir de uma experiência concreta de que o amor, esse espírito de abnegação e cuidado, nos ofereça uma resposta às misérias humanas.  Nossa primeira experiência nesse sentido se estabelece com o cuidado dos nossos pais e queremos que essa experiência se perpetue em todas as nossas relações. Criamos utopias para o amor e por isso ele se torna irrealizável. Essas utopias são construídas quando estendemos nossas experiências infantis de amparo familiar às nossas relações sociais, tendo a expectativa de amparo e cuidado, o que inclui, até, certa disciplina. É inegável certa frustração a essas expectativas.
O amor é uma exigência divina.

Sem meias palavras, sou um cristão e creio em Deus. Contudo, caso de fato ele não exista (e estou sendo meramente especulativo nisso) acredito que Deus represente uma contestação a autonomia de um homem completamente falido. Deus é o indicador de que o homem é um projeto falido, daí as intervenções na natureza, os milagres, a encarnação e ressurreição, conforme destacam a literatura bíblica. Se há um Deus que interfere (teísmo) há um homem que é incapaz de agir por conta própria. Mas para a linguagem científica, não há Deus algum que interfira em alguma coisa: o homem continua livre no espaço.

Para alguns Deus não existe por pura impossibilidade. Essa afirmação torna-se necessária para que o homem utópico que queremos tornar-se possível. O amor é uma exigência divina, e isto significa, mesmo que Deus não exista, que o homem é incapaz de amar. Que o homem é um projeto falido no amor.

Mais ainda: que o amor é impossível ao homem. Que o amor não existe por impossibilidade à natureza humana, que é uma utopia, uma invenção, que pode ser desconstruída historicamente e usado como instrumento de poder por séculos. Para alguns, Deus, que é impossível, se insere nessa categoria. Deus e o amor, impossíveis? Só podem estar num outro mundo, este também impossível.

Se é Deus que exige o amor, e Deus é impossível, o amor torna-se impossível, e da mesma forma, torna-se uma exigência que o homem fracasse amando. Se é o homem que exige o amor, o amor nada implica de divino e impossível. Ele é humano e possível e o homem deixa de ser um fracasso total e afirma sua autonomia. Acredito ser essa uma utopia equivalente a concepção de muitos céticos de que Deus não existe. Podemos apelar e evocar a imagem de indivíduos abnegados como Gandhi, Luther King e Madre Tereza. Todos eles amaram o que convinham amar: os indianos, os negros, os pobres. Isso é algo completamente possível e humano. A luta pelos mais necessitados pode até conceder direitos, mas a concessão de direitos nunca é uma prova de amor. Como se costuma dizer, o amor é uma condição universal, e isso, para muita gente não existe. Porque não existe? Porque o amor universal é um conceito cristão, e o Deus cristão, que ama o mundo inteiro, para a mentalidade contemporânea, simplesmente é impossível.

Contudo, se Deus criou o homem, e o homem é um projeto falido, Deus criou um projeto falido? Um questionamento apelativo. O amor é impossível, tanto para teístas, quando para céticos, cada um ao seu modo. Um, pela ausência de Deus, outro, por causa dele. A confiança que se tem na autonomia confere em mim uma desconfiança, da mesma forma como muitos céticos desconfiam da religião e da crença em Deus. Não, não acredito que o homem pode tudo, de alguma maneira ele sempre se sentirá fraco e impotente, apelando para a religião ou se negando a ela. Negar isso é viver numa mentira! Claro, religiões também conferem suas mentiras, e podem usá-las para explorar e corromper qualquer um. A conclusão é simples: não se pode afirmar que a vida sem religião e alguma fé é melhor que uma vida onde esses elementos estão presentes delas. Não se pode comparar essas realidades como qualitativas. Por outro lado, o abuso de poder, o autoritarismo próprio das instituições, religiosas ou não, não naturalmente passíveis de contestação. Com Deus ou sem ele. 

sábado, 9 de março de 2013

Provocações Filosóficas lll - O Caso " Feliciano"



Houve uma época em que o campo e a cidade representavam valores antagônicos. Esse tipo de antagonismo está presente até mesmo na bíblia. No Brasil isso começou a mudar com a modernização das capitais (do Rio de Janeiro na década de 30 e criação de Brasília, na década de 60). De lá pra cá, o Brasil passa por uma crescente modernização. As cidadezinhas do interior têm acesso a luz, rede de esgoto, televisão e internet. Isso altera e muito a imagem e a mentalidade do homem do campo. Mas esse homem do campo que pensa como o homem da cidade, de maneira que ambos são indicerníveis, tal como são indicerníveis o urbano do rural,  em muitas regiões de Brasil atualmente, não encontram seu maior exemplo na geração de nossos pais, mas sim nos filhos deles. Nossos pais são homens do campo que vivem na cidade. Claro que afirmo isso de forma metafórica para alguns e literal para outros. Analisando a biografia do deputado Marco Feliciano, de origem humilde no interior de São Paulo, e de como transformou sua fé cristã pentencostal  em trampolim político e deste para a presidência da comissão de direitos humanos da câmera dos deputados, é possível, pelo menos em parte, definir como se formou sua mentalidade. Isso não significa justificá-la. Significa compreender como se formou sua mentalidade. O que faz Feliciano objeto de horror para muitos cidadãos brasileiros, incluindo cristãos, se estabelece numa diferença de mentalidade, em tempo e lugar. Pior ainda quando essa diferença torna-se explícita diante de um cargo político, pois as mentalidades, sejam elas quais forem, particularmente de políticos, colaboram para a criação de projetos de leis que se destinam a uma infinidade de outras pessoas. Pelo menos em teoria, não se pode usar a própria mentalidade para a criação de leis: isso é tirania. O embate está ai: uma mentalidade contra a outra, mais do que isso, o que uma mentalidade pode fazer com a outra, já que está no poder, e isto não tem nada a ver com fé religiosa, mas sim com valores culturais engessados pelo literalismo da cultura, da religião, da vida. 

sexta-feira, 8 de março de 2013

Provocações Filosóficas ll - O Caso " Feliciano"



Historicamente os cristãos constituíram uma minoria. Um grupo irrelevante dentro do Império Romano. Acredito que hoje continuam sendo. Mas porque os cristãos constituíam uma minoria? Porque não se interessavam pelo poder político. Ignoravam o culto aos deuses protetores das cidades, ignoravam os imperadores, ignoravam as leis que buscavam inseri-los dentro da pólis romana como cidadãos. Algo considerado muito estranho na época. O mais estranho é que depois de Constantino, ao invés de fugir do poder, os cristãos passaram a amá-lo. Temem o que a ausência de representação pública lhes custou no passado: perseguição e morte! Dentro do poder, de minoria, os cristãos passaram a ser a grande maioria. De perseguidos a perseguidores. Sim, trata-se de uma vingança histórica. Em nenhum momento planejada pelo seu fundador. O cristianismo politizado é inconciliável com a proposta de amor incondicional, desapego e humildade. Não é cristianismo, porque o cristianismo de verdade, esse sim, continua sendo de uma minoria. Devo lembrar aos cristãos que o conceito cristão de pecado não possui valor jurídico, científico e até mesmo mesmo moral. Sendo assim, pecado não é o mesmo que um crime, uma violação das leis da natureza ou de imoralidade. Quem define o crime é a lei, quem define as leis da natureza é a ciência e o que é moral é definido pela cultura. Inegavelmente não vivemos numa cultura judaico-cristã, sendo assim, o conceito de pecado não pode definir o que é imoral na cultura. As leis jurídicas assim como as demais ciências (principalmente as da natureza e exatas) desprezam qualquer valor objetivo das religiões, sendo assim, pecado não poder ser o mesmo que crime ou um comportamento não-natural. Pecado é um conceito judaico-cristão que não possui nenhuma relação com política, mas sim, conforme salientou Kierkegaard, com nossa consciência de se estar a sós diante de Deus: algo pessoal, intransferível, e que determina a conduta pessoal, os valores pessoais, não coletivos.

quarta-feira, 6 de março de 2013

Provocações Filosóficas l



No início da minha juventude a filosofia me cativou pelo interesse que eu tinha pela verdade. Acreditava que a filosofia acadêmica contribuiria para uma melhor compreensão do mundo, dos homens, de mim mesmo. Mais do que isso, me ofereceria certezas sobre isso: um grande equívoco. Se a filosofia acadêmica fosse um instrumento de verdade, já mereceria descrédito por ser acadêmica, elitista. Nietzsche criticou bastante isso, e ele não era um filósofo de formação. Mas quantos filósofos de formação contestaram da mesma maneira a prática filosófica universitária? Particularmente não conheço nenhum. A verdade ainda é o grande mito da filosofia. A filosofia não constitui uma doutrina da salvação do homem, ela não permite uma soteriologia. É justamente o contrário: trata-se de uma reflexão sobre até que ponto estamos perdidos. A filosofia não é um instrumento de convencimento. A retórica é. A filosofia não nasceu com fins argumentativos em favor do filósofo ou do que ele defende. A filosofia não defende, ataca. Um argumento nunca é um ataque, é uma defesa. Argumentos não constituem a essência da filosofia, mas sim a dúvida. O filósofo consiste naquele que lança dúvidas sobre argumentos. Contudo, assim como o mais lógico, parte do menos lógico, a dúvida parte de certezas. A filosofia portanto, se desenvolve sobre o chão do senso comum, e em certa medida, não pode se tornar totalmente independente dele. Sendo assim, quando um filósofo parte de um argumento, ele não filosofa, contudo, quando questiona, livre de argumentações dogmáticas, ele é autenticamente um filósofo. Em toda a história da filosofia apenas um único homem consegui tal façanha: Sócrates. É justo o título de pai da filosofia. Platão e Aristóteles, por outro lado, partem de conceitos a fim de conferirem algum valor prático ao pensamento, o que era impossível em Sócrates. E como Platão e Aristóteles, nós filosofamos até hoje.