Estou morrendo.
Epifanias como essa não
acontecem todos os dias. A minha, vergonhosamente aconteceu enquanto
completamente bêbado, junto a palavras desconexas e choro compulsivo, berrava à
todos os pedestres na rua:
“Eu vou morrer!”, “Eu
vou morrer!”
Ninguém se atrevia a
chegar perto. Temiam que eu fosse violento e perigoso. Alguns riam sem parar e
debochavam entre si da cena ridícula que eu fazia.
Estou morrendo, e isto
significa que até aqui, no auge dos meus vinte anos, tenho passado a juventude
distraído à jogar meu tempo fora. Isso é assustador, pois afinal, talvez, não
haverá mais volta. Não há como recuperar esse tempo, e isso é fato.
Morrer é inevitável, e
toda vez que me imagino num caixão, apodrecendo e sendo devorado por milhões de
vermes, me estremece até a alma. Se de fato há alguma. Estou morrendo. Estou
gastando tempo. É impossível não deixar de gastar esse tempo. Como saber
gastá-lo? É preciso portanto, saber controlar o tempo que se gasta. Não se
trata, porém, de um simulado desejo religioso pela eternidade. Não desejo o céu
ou o inferno, mas apenas este velho, feio e decadente mundo que vivo.
Tenho uma estúpida, ou
brilhante (dependendo do ponto de vista) idéia de montar uma rotina. Até o
final da vida. Não adianta. Não tenho disciplina pra isso. Não me dou bem com
relógios e calendários.
Cheguei aos noventa anos!
Abro os olhos. Dois
anjos me encaram. Não sei dizer para onde me levam. No caminho, discutem entre
si o que farão da minha alma. Um deles, ironicamente e com um sorriso no rosto
perguntou:
- Como é a sensação de
morrer?
- Sinceramente não sei.
Não estava mais lá quando aconteceu.
Um comentário:
Seu texto é ótimo, achei o desenvolvimento muito interessante, porém com um final súbito...o que vc acha?
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