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sábado, 3 de julho de 2010

Jonas, o Pastor.

Desesperado, Jonas se decidiu pelo suicídio.

Estava cansado da vida, do trabalho, das frustrações amorosas. Estava cansado de si mesmo. Viúvo, seu único filho fora assassino por traficantes, por dívidas. De outro modo, cedo ou tarde, o crack também o mataria.

Jonas era Pastor.

No entanto, desiludido e ausente de expectativas quanto ao futuro, não quer morrer tal como morrem outros que tomam essa iniciativa. Quer subir a favela e enfrentar o dono do morro. Esbravejar palavrões, cuspir-lhe na cara, esmurra-lo na boca do estômago e nos dois lados da face. Morreria feliz enfrentando um ser tão desprezível – pensava consigo mesmo. Desiludido com a fé, não pensava em céu ou inferno. Queria morrer. Queria desesperadamente o fim de sua amarga vida. Apenas isso.

Sobe o morro recitando palavrões como se fossem orações – aos berros. Todos eles dirigidos aos criminosos ali presentes. A adrenalina o fazia suar tão intensamente que mesmo no outono, tinha a camisa totalmente ensopada de suor. Consequentemente, é segurado com força pelos dois braços e amordaçado. Recebe vários socos no rosto. Um chute no estômago o leva ao chão. Agora lhe chutam a cara. Repetidas vezes. Seu sangue começa a verter. Está diante do dono do morro num barracão. Jonas, ensangüentado e com o rosto desfigurado fazendo cara de deboche começa a rir. Seu riso evolui para uma gargalhada interrompida por um inesperado e violento tapa.

- Ficou maluco! Não tem medo de morrer ? Esbraveja Toninho, o dono do morro.

Jonas silencia. Como Jesus na cruz, ele não abre a boca. “Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?”. Passou esse verso do salmista em sua mente.

- Ajoelha. Ordenou um de seus carrascos.

Nessa hora ele sabe que seu momento chegou. Lentamente ele se ajoelha. Uma pistola surge em direção à sua cabeça. Jonas sente medo diante do seu fim eminente. Em seu íntimo ele ora pedindo perdão.
- Será que Deus me entenderia? Entenderia o meu ato de desespero? Pois eu não lhe consigo entender. Por que ele permitiu que minha mulher e depois meu filho morresse tragicamente? Jonas em seu coração pensou.

Ele iria morrer.

- Porque Deus não te ajuda agora pastor? Falou um dos vigias do barracão.

- Pastor?! Falou Toninho.

Quando soube que Jonas era pastor se recusou a matá-lo. Embora traficante Toninho tinha medo. Quando criança, órfão de pai e mãe por conta de uma enchente, fora criado por um tio muito rigoroso, que o levava a uma pequena igreja pentecostal na comunidade. Uma igreja de princípios bem rígidos. O pastor, com seus dons de cura e profecia, atraía em cada culto um número bem expressivo de pessoas, que procuravam alívio para suas dores diárias: não somente pelo número de doentes, mas também por dúzias de mães que procuram um consolo pela morte de seus filhos ou pelo fato de muitos deles estarem no crime organizado. Com Toninho não foi diferente: as ilusões de uma vida fácil no tráfico o fizeram aos dezessete anos sair de casa e abandonar a igreja também.

- Eu não vou matar um pastor. Toninho pensou.

- Amarrem ele. Ordenou aos seus companheiros.

Saindo do barracão, junto com todo o grupo, tentou convence-los que o melhor era que o pastor fosse embora. Afinal, ele não devia nada. Só estava desesperado pela morte do seu filho. O grupo consente. Eles retornam ao barracão.

- Pode ir pastor. Mas você não terá outra chance. Aconselha Toninho.

Jonas é desamarrado e empurrado para fora do barracão. Ensangüentado desce o morro. Em silêncio e em lágrimas. Agora suas dúvidas são outras: - Porque Deus permitiu que eu vivesse e meu filho morresse?

Entretanto, tinha a absoluta certeza de que estava vivo por ser Pastor. Estava convencido que mesmo diante do desespero e da intensa dor, Deus o amava, e ainda o via como seu filho.

Depois desse dia Jonas nunca mais pensou em querer morrer.

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