Particularmente, tenho uma visão dialética sobre a existência
de Deus. Deus existe, mas apenas no mundo em que ele cria. Vejo isso como uma
unidade em toda a bíblia, de gêneses ao apocalipse. O gênesis disserta mais
sobre a transformação de um povo nômade em sedentário do que sobre o verdadeiro
criador do universo e a origem do mal. Essa transição do nomadismo para o
sedentarismo não foi fácil, por uma questão muito simples: o Deus hebreu NÃO criou a Pólis.
A pólis (a cidade) é uma criação dos deuses. Dentro da Pólis o Deus hebreu
simplesmente não existia, ou no mínimo, era um entre os outros deuses. O
monoteísmo exige um mundo criado por Deus para que o próprio Deus exista nesse
mundo, daí a relutância quanto a sedentarização. Mas esse mundo não é
originalmente a Pólis. A sedentarização exige que o mundo de Deus seja a
cidade. Que Deus exista na cidade, e que por isso, assuma características
políticas e participe de sua lógica. Nasce a teocracia e mais tarde a Idade
Média. Nesse período, Deus não é visto como o criador da Pólis, mas como seu
soberano, como rei. Essa imagem vai se prolongar durante muito tempo, até a
ruína dos governos teocráticos, da teocracia judaica a Idade Média. A teocracia
muda de lugar: está nos céus, o Reino de Deus.
Se o Reino de Deus não está mais na Pólis, conseqüentemente,
os súditos desse reino tornam-se como no princípio, nômades. Ai está a mensagem
de Jesus. Deus não existe no Reino de César. Particularmente não interessam ao
cristãos provar que Deus existe no Reino de César. A lógica que movimenta a
Pólis exclui um Deus exclusivo e soberano, contudo, aceita uma pluralidade de
divindades menores. Diferente do nomadismo original de gêneses, os cristãos não
vagam por terras "neutras", por campos abertos, eles se inserem
dentro das cidades, até porque campos onde o nomadismo étnico seja possível é
praticamente inexistente na época. É preciso ser nômade nas cidades. Não ser da
Pólis estando nela. É justamente o estar na Pólis e não ser dela que se
estabelece o conflito dos cristãos com o Império Romano. Os cristãos não
seguiam a lógica de administração pública. Embora envolva uma questão religiosa
(pois os deuses são os criadores da cidade) há também uma questão política, de
insujeição, pois se os deuses são os criadores da cidade, são criadores de suas
leis e de determinar seus representantes (soberanos). Os cristãos se negavam a
prestar culto litúrgico ao Imperador, conseqüentemente aos deuses.
Inevitavelmente eram vistos como anárquicos.
Espalhados pelo mundo (nômades) mas inseridos nas cidades, os
cristãos fizeram que seu Deus ora assumisse a lógica das cidades, ora,
eventualmente, reagisse a elas. No primeiro caso ele se parece com um comunista
entre os cristãos comunistas, Judeu entre os cristãos messiânicos, Nazista
entre os cristãos alemães da segunda guerra, e etc., adequando-se a paradigmas
políticos. No segundo caso, pela sus raridade, destaca-se por questionar
qualquer paradigma político para Deus.
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