Particularmente
compreendo o ateísmo como camuflagem de um problema moral com a própria idéia
de liberdade. A maioria dos ateus compreendem a figura de um Deus pessoal como
um legislador moral. Como Dostoievski, entendem que "Se Deus não existisse
tudo seria permitido". Acontece que é isso que se deseja, que tudo seja
enfim permitido. Sejamos honestos: gostamos da liberdade, e tendemos sempre a reduzirmos ao máximo o
número de nossas obrigações morais. Para muitos ateus, Deus constitui uma série
de obrigações morais desnecessárias. Esse tipo de ateísmo limita-se a simples
negação da idéia de Deus. Algo que precisa ser respeitado e aceito com
cordialidade. O ateísmo sartriano é um exemplo disso. Contudo, para alguns
ateus não basta apenas negar pessoalmente a crença numa deidade pessoal. É
preciso opor-se a ela. Isso acontece por um motivo simples: porque gostamos da
liberdade, mas não gostamos de algumas de suas conseqüências. Justificamos as
más conseqüências de nossa liberdade como uma prova da impossibilidade da
existência de Deus. Isso significa: gostar da liberdade, contudo, sem querer
assumir as suas conseqüências. Esse é o perfil típico de qualquer anti-teísta,
o que compreendo como desonestidade intelectual, justamente porque Deus é
concebido como uma entidade por onde se procura justificar o mal.
Ora, se
Deus não existe não há nenhum bem ou nenhum mal a se justificar nele. Toda
iniciativa parte do homem, e isso ninguém, dos anti-teístas, deseja assumir,
pois isso implica não apenas o conhecimento, a tecnologia, as vacinas, mas
também a fome, as guerras, o capitalismo excludente. Alguns ateus necessitam de
Deus para culpá-lo e por isso não desejam extirpá-lo do debate público, mas
apenas de um tipo de discurso considerado razoável.
Se para muitos ateus, Deus constitui um
problema moral, para muitos teístas, Deus constitui um dever para com a vida. É
claro que há teístas que podem compreendem isso das mais diversas formas. Por
influência de Kierkegaard compreendo que esse dever para com a vida se
estabelece pela paixão. O sentido da vida se estabelece ai: aquele que
encontrou o seu dever no mundo, encontrou a Deus, o sentido de sua vida. E isso
acontece quando se encontra o motivo pelo qual se é capaz não só de se viver,
mas também de morrer. Sabemos que para isso não se tem necessidade de ser um
teísta confessional, e que por isso ateus podem ter encontrado Deus sem o
saberem enquanto muitos cristãos não o encontraram ainda.
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