Seguidores

domingo, 19 de dezembro de 2010

Sermão Cerimonial

Em ocasião de culto público na Igreja Batista de Vila Norma no dia 19 de Dezembro de 2010.

Jo.2.13-25


É comum aos pregadores do nosso tempo, se interessarem por esse texto por dois motivos: Primeiro porque Jesus está irado e segundo, porque sua ira é contra o comércio feito dentro do templo. Por incrível que pareça, a beleza do texto não está num Jesus irado que expulsa os mercadores do templo. Mas sim no motivo pelo qual ele faz isso. Sendo assim, o grande tema deste texto não pode ser outra coisa a não ser a graça de Deus. Um Deus que se ira por graça.

Jesus vai à Jerusalém para a páscoa. Uma festa religiosa onde se comemorava a liberdade. Jesus vai à Jerusalém, e o que ele encontra é uma nova forma de escravidão, justamente por meio da religião. É predominante no judaísmo da época de Jesus, a conquista do perdão de Deus por meio de sacrifícios de animais. O animal oferecido era um símbolo do pecado, assim como substituía ritualmente também esse indivíduo pecador. O homem pecador na linguagem da religiosidade judaica é comparado a um animal irracional. Tal como um boi que mugi e um cordeiro que bali. A morte do animal, assim como o derramamento de seu sangue representava a extinção do pecado, consequentemente o perdão divino. 

Na época, a maior fonte de riqueza era a terra. Era inevitável que os donos das terras se dedicassem também à criação de animais. O pobre não tinha terra. Sem terra, o pobre não poderia ter animais (com exceção dos pastores, que criavam suas ovelhas em terras livres). Não tendo animais, o pobre não tinha o que sacrificar para ter o seu pecado perdoado. Inevitavelmente pela lei, continuava pecador e por isso, excluído do templo, onde pela tradição judaica era o local onde Deus escolheu se manifestar. Por não ter sacrifício, o pobre era excluído da presença de Deus. No judaísmo vigente, exclusão espiritual era o mesmo que exclusão social.

Na época de Jesus, a grande maioria da população era pobre. Isso significava que apenas uma pequena elite teria condições de cumprir às exigências da lei para alcançarem o perdão de Deus. Os sacerdotes permitem a venda de animais para que o pobre tivesse a oportunidade de sacrificar. Mas como cobrar algo de alguém que não tem nada? As mesas estão cheias de dinheiro. É preciso, portanto, se vender e se corromper, se deixar escravizar. A páscoa se torna uma festa da escravidão de pessoas que apenas querem o perdão de Deus, e não de liberdade.

Diante dessa cena Jesus fica irado. O povo não está livre, mas é escravo de quem lhes prometeu liberdade. Com violência os comerciantes são expulsos do templo. Com esse gesto, Jesus demonstra que a graça de Deus não pode ser vendida, que ela não tem preço. E se a graça não pode ser vendida, igualmente ela não pode ser comprada. Que não existe homem que, por esforço próprio a conquiste. Com esse gesto, Jesus demonstra que a graça de Deus apenas precisa ser aceita, justamente porque diante de Deus, até o homem mais rico, mais sábio, mais justo e mais santo é muito pobre.

“Eu sou pobre e necessitado, porém o Senhor cuida de mim; tu és o meu amparo e o meu libertador; não te detenhas, ó meu Deus!” (Sl. 40.17).

Em Jesus Deus se ira diante da injustiça. A ira de Jesus também é divina, e é uma resposta diante da escravidão do pobre, daquele que não tem nada para sacrificar. Albert Camus escreveu: "Liberdade é uma possibilidade de ser melhor, enquanto que escravidão é a certeza de ser pior.".

Responderam pois os judeus, e disseram-lhe: Que sinal nos mostras para fazeres isto? (v.18).

Jesus promete destruir o templo. Um templo de pedra não pode limitar um Deus verdadeiro. O templo é destruído porque ele não é o verdadeiro templo de um Deus eterno. O verdadeiro templo de Deus é Jesus. Ele será torturado pelos homens, será imolado, sacrificado. Será o sacrifício para todo aquele que não tem como oferecer a Deus sacrifício algum. Para aquele que diante de Deus é pobre, isto é, todos nós.  Mas ao terceiro dia ele ressuscita.

Aceitar a graça de Deus é aceitar-se como muito pobre em relação a ele. É aceitar-se como alguém que para Deus não tem o que sacrificar. É aceitar o sacrifício de Jesus por nós. Jesus, o verdadeiro templo pelo qual a Deus temos acesso. Bertrand Russel escreveu: "A liberdade é algo maravilhoso, mas não quando o preço que se paga por ela tem de ser a solidão.". Jesus pagou o preço pela nossa liberdade. Em Jesus a páscoa se torna novamente uma festa de liberdade, onde todos podem ter acesso a Deus, sem dinheiro, inteligência ou até mesmo sem moral. Sem mérito. Apenas por meio de Jesus.

Soli Deo Glória.

Nenhum comentário: