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domingo, 12 de fevereiro de 2012

Resenha do Livro "Os Últimos Dias" de Liev Tolstói




Ler Tolstói sempre é um grande prazer. Por ser racionalista, o grande escritor russo acredita em demasia no poder da compreensão, no esclarecimento por meio de idéias elevadas. Acredita que o ser humano pode se deixar convencer por um bom argumento, muito embora, às vezes se convença também que isso nem sempre seja o suficiente. De que seja preciso também coração. Os Últimos Dias (Penguin Companhia, 2009), volume contendo uma coletânea de alguns dos últimos textos do escritor, expressa bem essa esperança de Tolstói, resumidas em textos breves sobre a essência de todo o seu pensamento: sua versão moral do cristianismo (trecho de “O Reino de Deus Está Dentro de Vós” e “O que é religião e em que consiste sua essência?”) sua defesa do vegetarianismo (trecho de “O Primeiro Degrau”), seu anti-cientificismo (“Ciência Moderna”), sua aversão ao militarismo e aos governos (“Patriotismo e Governo” e “Carta a um Oficial de Baixa Patente”), seus debates com o clero ortodoxo vigente (“Apelo ao Clero” e “Resposta à Determinação do Sínodo de Excomunhão, de 20-22 de fevereiro, e às Cartas Recebidas Por Mim a esse Respeito”) e sua crítica a adoração cultural a Shakespeare). Há também dois contos que merecem especial atenção: “Onde Está o Amor Deus Também Está” e “Três Perguntas”. Ambos emocionantes. 

Todavia, acredito ser o ponto alto do livro a apresentação, no conjunto da obra, de sua visão particular do cristianismo: a incompatibilidade entre o primeiro e o novo testamento, a descrição metafórica dos milagres, sua recusa em aceitar a divindade de Cristo e a trindade, a inutilidade dos ícones e etc; o que o aproxima do deísmo racionalista e do liberalismo teológico do séc.XIX. O cristianismo, segundo Tolstói é um conjunto de princípios morais estabelecidos por Cristo no sermão da montanha, fundamentado na não resistência ao mal. Princípio esse que o escritor explorou e definiu como a descoberta do sentido de sua vida. A herança deixada por essa compreensão é impressionante: talvez você não seja vegetariano ou liberal (teologicamente), talvez você não seja anarquista e ainda acredite no governo, todavia, é impossível não concordar com Tolstói de que a única maneira possível a fim de aprendermos o amarmos uns aos outros é considerarmos que não podemos fazer aos outros o que não queremos que os outros façam a nós. De que a única forma de acabarmos com a violência é nós mesmos sermos pacíficos, mesmo quando injustiçados, não resistimos ao mal.  

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