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domingo, 17 de junho de 2012

De Quem é o Rosto de Márcia Tiburi?



Olhar para traz, ver por onde se passou e tudo o que deixou pelo caminho. Comparar o que se era com o que se é. Alguns, não saberiam conter o riso. Para esses, o passado é algo que não merece novamente retornar à vida. Outros, no entanto, constatando o presente como um “espaço aberto”, ausente de significado e morto, procuram no passado o eu que pela força das circunstâncias foi legado ás sombras. Procuram nesse passado o seu futuro. Assim, Márcia Tiburi expressa em seu novo livro “Era Meu Esse Rosto” (Record) uma comovente e intensa reflexão sobre a necessidade recorrente a cada um de voltar ás origens quando o presente torna-se absurdo. Nesse aspecto, a memória torna-se o instrumento para a reconstrução da identidade e reavaliação de valores. Todavia, o que somos, não somos sozinhos. É justamente em nossas relações que se estabelece nossa identidade. Há algo em nós presente nos outros, que nos foi legado pelos outros. Todas as relações possuem uma origem. Quando envelhecemos, o passado costuma ficar doce e a infância açucarada. Talvez seja o pressentimento de algo amargo. Nesse aspecto, não há nada de poético na infância em si mesma. Ela torna-se poética à medida em que se distancia irremediavelmente de nós. Nesse aspecto há algo de freudiano em Márcia Tiburi, que ao evocar a infância de seu personagem, contrapondo-se à sua condição presente, compreendo o que somos hoje, uma síntese de relações e que ao longo do tempo nos foram subtraídas de modo abrupto. Lembrar é contar as perdas. A morte, assim como a memória da infância como reivindicação de identidade, torna-se o tema predominante na narrativa. O mundo está ai, e foi construído por pessoas que, caso não se manifestem, permanecem anônimas. Essas pessoas não se manifestam. O mundo, constitui portanto de uma série de biografias anônimas de fantasmas representados por lápides nos cemitérios (reais e os da memória). Lembramos e temos saudade, e nesta saudade reside um pouco de cada um de nós que se perde nos outros.
Caríssima Márcia,
Esse não é o seu rosto, na parte ou no todo, é o rosto de todos nós.

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